Lasanha Vegana de Beringela ou o último zepelin


Maria Antonia olha a geladeira enquanto pensa o que fazer para a  janta. É sábado e ela quer comer alguma coisa especial.  Alguma coisa de sabor único. A transição para o veganismo já dura mais de seis meses  e, se parar de comer carne foi fácil, o mesmo não pode ser dito sobre parar de consumir queijos, sua paixão.  Mas… vencer paixões é com ela mesma, pensa enquanto separa beringelas, inhames e tomates. Vai fazer sua receita vegana predileta, aquela que faz ela esquecer que existe queijo. 

Enquanto ouve Tim Maia no celular, Maria Antônia, começa a tirar a casca do inhame para colocar pra cozinhar,  e então Mateus entra na cozinha.  Estão juntos ha 7 anos e esse é, de longe, o relacionamento mais duradouro da vida dela. Ela sente que esse é pra vida. Ambos com 43 anos. Ambos no segundo casamento oficial. Ambos com um passado amoroso bem turbulento. Ela olha pra ele e o coração se aquece. Aquele é seu homem. O estilo vagabundo nato. Camisa de banda de rock, bermuda largada,  barba por fazer e aquele olhar que derreteria geleiras.

Mateus sorri pra ela, pergunta se quer ajuda pra preparar o jantar. Ela agradece e diz que não precisa. Ele faz um gracejo, lhe dá um afago malicioso no corpo e vai terminar as cadeiras de madeira que está fazendo. Sim, porque o homem além de ser bonito, tocar violão e cantar nas horas vagas, ainda se distrai na marcenaria. Estar com Mateus é um desses presentes que a vida as vezes reserva pra algumas pessoas. 

O inhame tá no fogo cozinhando e ela começa a picar as cebolas,  o alho  e os tomates para o molho.E sozinha na cozinha ela pensa nas últimas semanas…ou melhor, na paixão das últimas semanas. No Instagram um antigo colega do curso técnico de enfermagem sempre curtia suas fotos. Num domingo, sem nada pra fazer, ela respondeu o stories dele com uma mensagem de texto dizendo que o tempo não passava pra ele. 

Começaram a conversar. Quando ela percebeu, já estava falando da admiração que sempre teve por ele. A conversa encerrou com ele dizendo que também a admirava muito, em todos os aspectos.Maria Antônia saiu do Insta, mas o “todos os aspectos ” não lhe deixou mais nem um instante.  Ficou pensando em como o colega mexia com ela na época do curso que fizeram juntos, há quase 15 anos atrás. De como ele tocava violão,  falava poesia.

Epa!! Ele tinha o mesmo estilo de Mateus e agora olhando com calma, ela percebia que todas as suas paixões tinham o mesmo estilo… homens talentosos, poetas, músicos. Homens fora da caixinha.Nunca gostara de homens malhados, de roupa social e tal. Gostava era do estilo mano, louco, poeta. Ficava derretida.

E enquanto refoga as cebolas no azeite e coloca o tomate ela recorda as conversas que se desenrolaram na semana. Marcelo, o colega do curso falava da vida, mostrava as poesias escritas, os colares e brincos feitos.  Sim, porque o danado do Marcelo era metido a artesão também.  Cada trabalho lindo em sementes e pedras. E conersavam. Relembraram momentos da turma. Falaram de amores, paixões. E cada frase trocada tinha duplos, triplos, sentidos. Mas quem disse que alguem assumiu alguma coisa? Só aquela sensação de coração disparado, de pernas bambas ao abrir o direct e ver que tinha mensagem dele.

O molho de tomate ficou pronto. Maria Antônia então vai fazer o creme de inhame. Coloca no processador o inhame cozido, sal, azeite,  alho,  duas colheres de limão e processa por 5 minutos e então o creme de inhame está pronto também.

Assim como há uns dias atrás,  estava pronto na cabeça de Maria Antônia o encontro com Marcelo. Eles iriam se encontrar numa cidade neutra, nem a dele, nem a dela. Falariam da vida, de poesia…. tomariam um café. E ela beijaria aquela boca linda, tocaria aquela pele mestiça, ouviria no seu ouvido aquela voz cheia de sensualidade de alguns videos de musica dele que ela viu no feed.

Foram mais dois dias de conversas e flertes indiretos no direct e então, assim como veio, a paixão foi embora. Nem sabe dizer se foi algo que ele disse, o que ele não disse, ou simplemente ciclo das paixões mesmo. Maria Antonia desistiu.

Enquanto coloca as camadas de Beringela, molho de tomate e creme de inhame na forma, Maria Antônia sorri. Ela e suas paixoes. Coisas que vem e vão embora com a mesma rapidez.

Com o passar dos anos ela aprendeu.  Já não larga mais  tudo pra correr atras do zepelin como diz Leléu no filme Lisbela e o Prisioneiro. Já não se deixa levar pelo vento. Mas é impossível não seguir o zepelin com os olhos, se encantar e pensar como seria sair correndo atrás dele. Mesmo sem se deixar levar, é impossível não sentir a brisa do vento entrando pelos cabelos e lhe trazendo um breve arrepio.  Ela está viva. É feita de vento, de ar, de fogo, de paixões.

A lasanha de beringela vai para o forno. Maria Antonia sorri. Venceu mais essa paixão. Marcelo de vez em quando ainda vai lhe provocar um arrepio,  lhe despertar algumas emoções, mas a fase crítica passou.  

Mateus?  Continua sendo o seu homem, seu amor pra vida. O último zepelin que ela correu atrás.

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