Pudim gelado de banana, ou experimentando sair da linha


A segunda feira começa com ela ainda deitada. Sempre faz trezentos mil planos para os dias de folga, mas quando esses benditos dias chegam, cadê a coragem? Ela vira na cama, pega o celular no chão vê as horas. Já é quase dez. Não tem mais sono mas também não quer levantar. Aproveita o celular na mão, corre o feed do insta,do Facebook. Dá aquela conferida nos status do zap… Quando vê já  é onze da manhã. Levanta e quer tomar banho… mais um banho. Mas antes do banho, resolve fazer um doce rápido, daqueles que não dão trabalho e compensam pela delicia. Separa 02 bananas, meia xicara de café de açuçar, meia xicara de café de agua,e uma xicara de café bem cheia de chia.

Ela bate as bananas no liquidificador, com a água e o açucar. Em dias normais não colocaria mais açucar, mais hoje especialmente quer e precisa de algo bem doce, pra colocar as idéias no lugar. Coloca o creme de banana que se formou numa tacinha com as sementes de chia, mistura bem e leva para a geladeira. Hora do banho.

Maria Alice trabalha numa unidade de internação para adolescentes autores de ato infracional já há dez anos. E nesses dez anos já viu de tudo. Sempre que chega em casa toma um banho demorado, como se a água pudesse lavar pensamentos, emoções,  angústias. Mas essa segunda era diferente.Tinha tanta coisa a ser lavada.

Domingo foi dia de plantão, e era dia de visitas. Como agente de apoio, era responsável por acompanhar as visitas, ficar de olho, garantir a segurança. Mas, nesse domingo, o pai do menino do Módulo T, veio na visita. Ziiiiiica demais.

Maria Alice, 40 anos, tinha vindo para a cidade por causa do concurso. Pensava tentar uma transferência depois. Mas bastaram dois anos pra ela perceber que ali era bem melhor.Nada de cobranças sobre namorado, casamento, filhos.Nada de explicações sobre os raros pileques. E assim foi ficando,a família acostumando com ela morando sozinha em outra cidade.

Quando percebeu já fazia 10 anos.Do alto de seus 40 anos, tinha a vida que gostava. E justamente por seus quarenta anos bem vividos, ela soube de imediato, que aquele pai tava querendo ultrapassar alguns limites.Começou com olhares, tentativa de puxar conversa  E ela na defensiva. Jamais se envolveria com um pai de adolescente atendido.

Tá certo, que aquele era O PAI! Ela intimamente o chamava de Johnny,  pois o danado era a cara do Johnny Deep, seu ator preferido. Tinha aquela cor que se não era preto, tampouco era branco. Aquele cabelo meio ondulado e de fios grossos. Enfim… uma combinação que era maldade com o seu celibato convicto.

E então,  nesse domingo , ficou bastante surpresa, quando ao sair do plantão as dez da noite, passou na loja de convêniencia pra pegar um doce e ele estava lá…como se a esperasse. Falou pra ela não ter medo,  que só queria conversar. A chamou para uma sorvete ali mesmo. Relutante, mas com a sensação de já ter ido longe demais pra voltar atrás, ela sentou na cadeira e a conversa fluiu.

Fluiu tanto que depois de algum tempo ela já estava tomando banho de banheira e comendo pizza numa cama redonda.Era quase duas da manhã, quando cada um seguiu seu caminho e ela chegou em casa. O primeiro banho foi pra limpar o corpo, o segundo foi pra acalmar a alma e o terceiro foi pra tentar relaxar o espírito e conseguir dormir.

E então, nessa segunda feira, ela está no quarto banho, o da consciência. Duas horas depois, cabeça no lugar,  pensamentos arranjados de forma a saber que o fato não ia se repetir, ela olha a geladeira e o pudim esta pronto, geladinho e cremoso.

Ela sabe que devia almoçar primeiro. Mas é sempre tão certinha com a alimentação, que um dia ou outro uma extravagância não faz mal. E enquanto saboreia o seu pudim, pensa que isso não pode virar hábito. (comer doce antes do almoço ou sair com pai de adolescente, hein Dona Maria Alice?) Mas é tão bom!

O que é bom, Maria Alice?

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